Contemplação

Contemplação

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Na sacada, fiquei por alguns minutos, tentando ser plateia deste teatro do qual todos somos personagens. Venci a culpa do inútil. Como assim? Deixar as tarefas com uma certa finalidade para me permitir a observação dos corpos sobre as pedras urbanas? Sim, preciso enxergar multiplicidade. Sapatos sociais, pressa, chinelos de dedo, calma, vestido florido, leveza. Todo mundo carrega um mundo inteiro dentro de si. Misturo os recortes, e eles se encaixam. A vida que transborda no jeito de caminhar, no olhar que vaga. A moça com unha pintada, a senhora com os pés cansados. Ser é plural. Seres. Aprecio. O devaneio toca, renova, clareia. Perto de mim, ouvi comentários de que eu não estava fazendo nada, na contramão das cartilhas modernas com receitas de produtividade. Temos de ser dinâmicos, atualizados, virtuais. Funcionais. Mas, onde fica o imprevisível grito da alma? Ignorei as vozes de repreensão dentro da minha própria mente. Quero mais é captar o instante da existência para pendurar na parede de casa. Ou usar nas páginas do jornal. Defender a imaterialidade, o processo, a composição. O espaço da arte. Desmedido. Incalculável.

(Texto e fotos: Alina Souza)


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