Hospitais de excelência no RS atraem visitantes

Hospitais de excelência no RS atraem visitantes

Porto Alegre tem dois hospitais entre os dez melhores do Brasil, aponta ranking

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Por Vitória Miranda

Com hospitais reconhecidos entre os melhores do mundo, o Rio Grande do Sul tem se destacado como destino para pessoas que buscam procedimentos médicos. De acordo com a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), mais de 20% dos visitantes do Estado vieram para tratamento de saúde.

A incidência do fator saúde foi maior do que o profissional, que representou 16% das visitas. Vale destacar, porém, que os dados são de 2021, ano marcado pela pandemia, tendo sido registrado um aumento de 7,3% em relação ao ano de 2020.

Os visitantes vêm de outros estados do Brasil e até mesmo de fora do país. Foi o caso da jornalista Cláudia Flores, brasileira que mora na Irlanda há sete anos e decidiu vir ao Brasil para uma cirurgia de retirada do rim em janeiro deste ano.

Cláudia mudou-se com o marido para Dublin, na Irlanda, há sete anos. Atualmente, ela trabalha no modelo home office como produtora de conteúdo freelancer para uma empresa canadense. Mesmo bem adaptada à vida no norte europeu, realidade que se concretizou com a cidadania irlandesa conquistada neste ano, ela se decepcionou com o sistema irlandês ao passar por um problema grave de saúde em junho de 2023. Cláudia notou um inchaço no lado esquerdo do abdômen e, a partir desse momento, levando-se em consideração consultas e exames, demorou seis meses para ser diagnosticada com um tumor no rim, com orientação para cirurgia.

Mesmo após receber o diagnóstico, ela se surpreendeu ao ser colocada em uma fila de espera para mais exames que confirmariam a necessidade do procedimento. Incomodada com a demora, Cláudia entrou em contato com um médico de confiança de sua família, em Porto Alegre. Ao analisar os resultados do exames, o profissional, que atua no hospital Moinhos de Vento, afirmou que ela precisava ser operada o quanto antes e recomendou que ela viesse ao Brasil para agilizar o processo.

A operação foi feita de forma privada no Hospital Moinhos de Vento, uma vez que o plano de saúde de Cláudia cobria apenas atendimentos na Irlanda. Um dia após a cirurgia, ela já estava na casa da família e, um mês depois, já havia retornado à Europa completamente recuperada. Na Irlanda, Cláudia retirou-se da fila de espera para exames.

“Falei com amigos na Europa, Estados Unidos e Canadá e as pessoas me falaram que o sistema de saúde desses lugares envolvia muito mais espera e menos qualidade no atendimento do que no Brasil. Fora as dificuldades do idioma. Com todas as dificuldades que o sistema tem, o Brasil ainda é referência para outros países. Sei que no Brasil também há espera e falo isso de um lugar muito privilegiado de quem pôde pagar por uma cirurgia. Mas se eu morasse no Brasil, acredito que poderia ter feito a cirurgia pelo SUS, porque teria mais tempo e não estaria em situação de urgência”, refletiu.

No mapeamento “World's Best Hospitals 2023”, feito pela revista estadunidense Newsweek, o Rio Grande do Sul tem dois hospitais entre os dez melhores hospitais do Brasil. Na Capital, o Moinhos de Vento aparece na terceira colocação e o Mãe de Deus ocupa a sétima colocação. As avaliações levam em consideração o atendimento de primeira linha, a pesquisa de ponta e a aderência a práticas inovadoras.

O Estado também é líder no país em quantidade de leitos hospitalares por habitante e pela oferta de hospitais. É o segundo maior índice de leitos por mil habitantes entre os estados brasileiros, com 2,58 leitos a cada 1.000 pessoas. No total, são 330 estabelecimentos hospitalares distribuídos entre 226 dos 497 municípios gaúchos.

A maioria, 34 deles, está em Porto Alegre. Além da Capital, os município de Caxias do Sul, Pelotas, Passo Fundo e Santa Maria compõem a lista de cidades que concentram cerca de 20% dos hospitais do Rio Grande do Sul.

Reconhecimento para instituições públicas e privadas da Capital e do Interior

Melina Schuch, superintendente de estratégia e mercado do Hospital Moinhos de Vento, explica que hoje cerca de 10% dos pacientes da instituição são de pessoas de fora do Estado ou do exterior. Em 2023, foram recebidos 6.546 pacientes de fora do RS, distribuídos entre Santa Catarina (51,7%), São Paulo (16,6%), Rio de Janeiro (6,5%), Paraná (4,7%), Bahia (2,7%), Mato Grosso (2,5%) e Distrito Federal (1,7%). Segundo ela, receber pessoas de fora do Estado é estratégia que o hospital vem trabalhando nos últimos 10 anos.

A demanda destes pacientes normalmente é por cirurgias ou por procedimentos de alta complexidade que não possuem em sua região, sendo a maioria atendimentos particulares ou por convênios internacionais. As áreas mais requisitadas por estes pacientes no Moinhos de Vento são ortopedia, neurologia, cardiologia e oncologia.

Nos últimos anos, o Moinhos de Vento fez investimentos significativos em tecnologia e equipamentos de precisão, incluindo sistemas de neurocirurgia robótica, neuronavegação de última geração, tomógrafo portátil para uso transoperatório, sistema de integração de imagens, ecógrafo de última geração para uso robótico e videolaparoscópico para uso em cirurgias de tumores de órgãos sólidos, por exemplo.

O objetivo da instituição é seguir sendo uma referência internacional. Para isso, o hospital qualifica seus profissionais no exterior e possui uma gerência especializada em experiência do paciente. Os cardiologistas, por exemplo, têm a oportunidade de realizar especialização na universidade de Harvard, em Boston, no EUA. O hospital também tem parcerias de pesquisa e formação de profissionais com as instituições estadunidenses Mayo Clinic, considerado o melhor hospital do mundo, e Johns Hopkins Medicine, hospital referência em pesquisas e atendimento na área de oncologia.

“Os pacientes estrangeiros vêm de locais diversos, mas principalmente da Europa e da América Latina, da América do Norte com menos frequência”, contextualizou Schuch. Em março deste ano, por exemplo, o hospital recebeu uma senhora turista da Suíça que estava de passagem em Porto Alegre e precisou ser internada no Centro de Terapia Intensiva (CTI). “Ela possui uma cardiopatia e teve uma descompensação. Chegaram aqui ela e o marido e entraram em atendimento de urgência com o convênio internacional. Estavam relatando que o atendimento é muito melhor do que lá, falaram que se sentiram muito bem acolhidos”, contou Schuch.

O Hospital Mãe de Deus, por sua vez, é referência na realização de cirurgias eletivas ambulatoriais, por meio do Hospital Dia Unidade Carlos Gomes (UCG). A unidade, que atende pacientes particulares ou por convênio, passou por uma reforma para ampliação de salas cirúrgicas, leitos de recuperação e espaços acolhimento.

Dentre as intervenções agendadas, as mais comuns são as cirurgias plásticas, depois as cirurgias de traumatologia e ortopedia, cirurgia geral, ginecologia e urologia. Diego Pizzio, Gerente Executivo da UCG, comenta que o foco da unidade são os procedimentos de baixa e média complexidade, associados ao bem-estar, que dispensam internação por mais de 24 horas.

Como a UCG possui cirurgiões plásticos reconhecidos internacionalmente, que são convidados para ministrar cursos e congressos nos EUA, muitos pacientes de fora de Porto Alegre procuram a unidade, incluindo estrangeiros. O hospital já recebeu pacientes vindos dos EUA, Suíça, Inglaterra e China.

Com experiência em atender clientes de classe alta e até famosos que exigem sigilo a respeito de sua internação, o Hospital Mãe de Deus Carlos Gomes conta com concierges, profissionais responsáveis por cuidar da estada dos pacientes do início ao fim.

Os pacientes estrangeiros e acompanhantes são acionados com antecedência pela equipe, que medeia o contato com o médico, passa orientações para ambas as partes e organiza a estada dos visitantes em Porto Alegre, oferecendo a possibilidade de contratação do pacote de hospedagem no hotel integrado à recepção do hospital.

Em outro ranking, da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), dois hospitais públicos gaúchos também foram avaliados como os melhores hospitais públicos do país: Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e Hospital Geral de Caxias do Sul.

Os hospitais públicos, contudo, não têm a mesma relação com o chamado “turismo de saúde”, visto que o SUS prioriza atendimentos nos estados onde os pacientes residem. No Hospital de Clínicas de Porto Alegre, apenas 1% dos pacientes são encaminhados de outros estados. A porcentagem representa pacientes que necessitam de tratamentos inexistentes ou não disponíveis em seu estado de origem. Nesse caso, o SUS garante o transporte e o tratamento, conforme portaria do Ministério da Saúde, chamada Tratamento Fora de Domicílio (TFD).

Outros dois hospitais gaúchos, de Caxias do Sul, aparecem no ranking “World's Best Hospitals 2023”: Hospital Unimed e Hospital Pompeia. Segundo o diretor presidente da Unimed Nordeste RS, André Leite, 17.355 pacientes de fora do Estado recorreram ao Hospital Unimed de Caxias do Sul ao longo de 2023. Deste número, 63 foram estrangeiros. As áreas mais demandas são Oncologia, Clínica Médica, Ginecologia e Obstetrícia, Cirurgia robótica, Ortopedia e Traumatologia, Pediatria e Pneumologia.

“O volume considerável de atendimentos junto ao hospital Unimed se deve a este ser um dos Hospitais de Alta Complexidade de maior relevância no Estado, com tecnologia de ponta, 1.250 cooperados compondo corpo clínico, 60 leitos de UTI, hemodinâmica acreditada com selo diamante, atendimento em todas as especialidades e subespecialidades médicas, acessibilidade, excelência da qualidade assistencial”, justificou o diretor da Unimed Nordeste RS.

O Hospital Unimed de Caxias do Sul também possui um heliponto que permite o acesso de forma mais ágil, sobretudo para os casos de maior gravidade. Além disso, a instituição é certificada internacionalmente com selo Qmentum, modelo internacional de avaliação, responsável por assegurar que as organizações estão cumprindo todos os requisitos de segurança.

Governo do Estado entende que há espaço para crescimento

A Secretaria de Turismo do Rio Grande do Sul (Setur) avalia que o cenário descrito é de oportunidade para os negócios gaúchos associados à área da saúde, tendo em vista que o movimento de busca por procedimentos médicos foge à sazonalidade do turismo no Estado. Na análise da secretaria, a demanda maior é para o setor de hotelaria e serviços ligados ao relaxamento e bem-estar.

“É importante que a gente levante essa bandeira para que o próprio Rio Grande do Sul saiba de seu potencial e as empresas possam se preparar para melhor receber esses turistas, que buscam por cuidados especiais", ressaltou o diretor geral da Secretaria de Turismo, Rafael Carniel.

Carniel destacou ainda que os estabelecimentos turísticos locais estão acostumados com o perfil de cliente que vem ao Estado para procedimentos médicos, caracterizado por pessoas de renda alta e média alta, mas a adaptação passa por saber se comunicar com os visitantes e encontrar formas de melhor atendê-los, oferecendo cuidados como administração de medicamentos e atividades de lazer adequadas ao momento pós-cirúrgico, por exemplo.

Com o objetivo de divulgar os atrativos turísticos do Estado, Carniel esteve na Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL), de 28 fevereiro a 3 de março, além de ter participado de reuniões sobre o tema na embaixada do Brasil em Portugal. A BTL é uma feira voltada ao setor turístico que reúne empresários e representações governamentais de todo o mundo. Neste ano, o evento teve agenda aberta ao público geral durante três dias. Para diretor geral da Secretaria de Turismo, Lisboa é um excelente lugar para divulgar o turismo no Rio Grande do Sul, considerando “a capilaridade do aeroporto de Lisboa e a forte ligação aérea entre Lisboa e Porto Alegre”.

O Rio Grande do Sul esteve presente na BTL com um estande expositivo, onde apresentou os destinos turísticos do Estado nas áreas de saúde e bem-estar, cultura e gastronomia, natureza e entretenimento. Os serviços voltados para o bem-estar e saúde mental, como SPAs e retiros em meio à natureza, estiveram presentes na exposição do Estado na categoria “turismo de saúde e bem-estar”. Dentre os atrativos encontrados na região, Carniel destaca os parques de água termal e piscinas ao ar livre, que são encontrados em cidades como Nova Prata, Machadinho, Iraí, Três Arroios e Restinga Seca.

Ele citou ainda o setor de biocosméticos baseados na erva-mate e a rede de spas e hotelaria, que encontram um “panorama de crescimento muito positivo”. No setor de estética, bem-estar e terapias alternativas, também enquadrados no âmbito do turismo de saúde, o Rio Grande do Sul possui SPAs de referência, como o Kurotel de Gramado, que está entre os melhores do mundo e a Clínica Harmonia, em Caxias do Sul, que realiza transplante capilar e outros procedimentos estéticos.

Apontado pelo Ministério da Saúde como a segunda maior porta de entrada de turistas estrangeiros no primeiro semestre de 2023, em ocasião do fluxo de veranistas vindos dos países vizinhos, o Rio Grande do Sul tem oportunidade para se consolidar como um Estado capaz de reter os visitantes ou conquistar o retorno deles. Conforme evidenciado na matéria, o fortalecimento dos destaques regionais, como é o caso da qualidade da rede de saúde e da alta oferta de passeios associados ao bem-estar, é uma estratégia importante que contribui para o desenvolvimento do Estado.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895